Olá, tudo certo?
Victor, por aqui. Assim como muitos, estou em busca da vaga dourada em produto. Mas, enquanto ela não chega, vamos debater um pouquinho sobre uma não tão recente polêmica que gerou muito clickbait e interpretações rasas, pânico e muito mais.
No dia 23 de junho, o mundo de produto ficou pasmo e temeroso após algumas falas bombásticas (será?) do CEO do AirBnB, o ilustre Brian Chesky. Vamos para as ditas cujas:
“Designers have been elevated to the level of product managers.”_
Em tradução livre: “designers foram elevados ao mesmo patamar de product managers”.
“We’re getting rid of classic product management, and we’re going to combine product marketing and product management like Apple does.”_
Em tradução livre: “nós estamos nos livrando do papel clássico de product management, e estamos unindo os papéis de product management e product marketing management como a Apple faz”.
Bom, acredito que muito já foi dito sobre a fala do Brian e aquilo que, de fato, ele quis dizer. Este texto não se centrará exatamente sobre estas assertivas do CEO do AirBnb, mas sim sobre todo o alvoroço que elas causaram. Ainda assim, acredito que seja válido pontuar algumas cositas sobre.
Como eu sou uma pessoa que tem uma estradinha no marketing, não me causou muito espanto que, em poucos minutos, o LinkedIn e o Twitter estivessem bombando de postagens sensacionalistas sobre as falas do Chesky. Afinal, a gente sabe que polêmica chama muito mais a atenção do que algo reflexivo. Porém, o que mais me impressionou foi que tais postagens vieram de pessoas conhecidas da área, tanto aqui do Brasil como de fora. Tal foi o disparate que o próprio Chesky teve de se explicar no Twitter e dizer que ele jamais disse que a carreira de PM estava exterminada. É um tanto preocupante ver postagens de influenciadores tão enviesadas por clickbait, sobretudo porque muitas pessoas em migração para produto ou que ainda são jovens na área ficaram perplexas e deveras preocupadas. Acredito que faltou, como de costume, um pouco de empatia e responsabilidade. O que importa mesmo é engajar a audiência.
Dos popstars de produto, acredito que o Joca (Joaquim Torres) foi bastante feliz em seu texto. Além de ter dado uma bela interpretação sobre o fala do Chesky, ele trouxe o contexto do AirBnB para as entrelinhas, algo que o próprio CEO trouxe, mas que, claro, os clickbaiters excluíram das polêmicas. No resumo da ópera, o Chesky nunca disse que ele excluiu os PMs do AirBnB, o que ele falou foi que, devido a sua operação, os cargos de PM e PMM se fundiram na empresa. Mais do que isso, ele trouxe o time de design para o mesmo degrau de tomada de decisão que os times de produto. Por quê? Simples, além de designer, a empresa é muito orientada por design. Um outro ponto fundamental é que o AirBnB passou a ter apenas duas releases por ano. Diante disso, faz ainda mais sentido unir a área de marketing de produto com a de gestão de produto. Ou seja, para o AirBnB, todo este movimento fez muito sentido. Mas, será que faz sentido para todas as empresas e contextos diversos? Resposta curta: claro que não! Como bem pontuou o Arthur Castro em seu brevíssimo post do LinkedIn, a “cultura Spotify” não serviu e não serve para todos (vale lembrar que eles não trabalham com squad há um bom tempo, hein?!).
Aqui, sim, é onde reside a minha real preocupação com todo este contexto do Chesky. Num primeiro momento, podemos nos perguntar: puxa, o que levou a comunidade de produto estremecer? Acredito que as respostas são várias, mas, eu tentarei elencar algumas delas, se você tiver mais, joga nos comentários e simbora.
A área de produto, quer queiramos ou não, é nova no Brasil. Geralmente, tudo aquilo que é novo ainda não tem fortes alicerces erguidos. Basta lembrar que nem temos um curso de graduação em produto, não que precisemos, na minha opinião. Então, por ser algo novo, é bastante comum que pequenos ruídos causem significativos abalos.
Em seguida, algo que não me deixa sossegar é imaginar que muitos profissionais de produto sentem-se inseguros porque migraram há pouco tempo ou estão trabalhando com isso há pouco tempo. Mas, acho que podemos ir um pouco além. Durante a pandemia, a área de produto era uma terra linda de se viver, muita gente migrou, a área ficou extremamente em alta e, com isso, uma bolha se formou (ou não). Com este boom, muitos profissionais tornaram-se seniores com pouquíssimo tempo de estrada, salários inflados e tudo era lindo com o baita cash burn que as startups realizaram. É natural que muitas destas pessoas tenham se intimidado com a possível extinção do papel de PM.
Um terceiro ponto fundamental é que, puxa, trabalhamos com tecnologia, né? Tudo se move com uma celeridade ímpar, devemos, assim, nos adaptar e, lógico, entregar resultado. Então, qual o grande problema em fundir PM com PMM num contexto específico?!
Tudo começou ainda na década de 30 do século passado, com o ilustre executivo de publicidade Neil H. McElroy, um empregado da Procter & Gamble (P&G). Em 1931, ele redigiu um “memo” para o CEO da P&G pedindo para ele autorizar a contratação de mais pessoas para a área de promoção. A justificativa era simples, tinha-se muito foco em publicidade, mas, pouco se sabia, de fato, sobre as dores dos clientes e usuários da P&G. Portanto, funcionários foram contratados sobre a alcunha de “Brand Man”, ou seja, homem da marca/produto (em tradução livre). Pois é, nascia, então, o famoso papel do gestor de produto, ou, pelo menos, algo bastante próximo do que um PM de 2023 atua. O que o McElroy “inventou” foi nada mais, nada menos, que um profissional que estava coladíssimo com o cliente e usuário, trazendo feedbacks constantes e melhorando e/ou adequando o produto feito pela P&G. Acredito que é exatamente este o papel do PM: unir, de maneira positiva e escalável, negócio e usuário.
Avançando um pouquinho mais, lá por volta do final dos anos 90 e inícios dos anos 2000, o ilustre Phillip Kotler lança a bíblia do marketing em que traz os quatro famosos “pês”: praça, preço, promoção e produto. Hum, perdão se, desde já, este texto pode ser um banho de água fria, mas, sim, gestão de produto nasceu de modo muito imbricado com marketing. É claro que não estou falando que o “produto” dos quatros pês de Kotler é gestão de produto de hoje. Não seria ingênuo, afinal, muita coisa mudou de lá para cá, mais do que isso, gestão de produto tomou corpo e se individualizou como área profissional.
É tão verdade que a área de produto se formou que, hoje, temos uma corrente grande de especialização com uma sopa de letrinhas: PMM (product marketing manager), TechPM (techinical product manager), DataPM (data product manager), ProdOps (product operations), program manager, brand manager e etc. Fora áreas correlatas que só aumentam este caldo como PLG e growth. O Diego Eis tem um texto curto e objetivo sobre a evolução dos profissionais de produto, assim como o crescimento da especialização frente ao papel mais generalista do produteiro. A gênese do gestor de produto é, por si só, generalista (mas não rasa). Conforme os negócios tendem a se especializar, é natural que os profissionais também criem mais tato com certas funções e, daí, nascem os arquétipos; assim foi com marketing, design, UX e etc. Por outro lado, concordo com uma fala muito feliz do Eduardo Fonseca, infelizmente, ouvi numa live que não tenho link: “todas as especializações de product management são arquétipos, é preciso, sempre, manter o foco no principal: trazer resultado para o negócio”.
Então, vamos focar naquilo que é essencial para o profissional de product management estabelecer a ponte entre negócio e usuário com o intuito de mexer positivamente nos ponteiros da empresa e levar solução para o usuário. Ah, vale lembrar a reflexão: será que toda empresa precisa de um PM? Finalizo o meu texto com algumas falas brilhantes do Aíquis Rodrigues para a Brilliant Basics:
”Enquanto o mercado não dá a volta para o “crescimento a todo custo”, PMs vão ter que se adaptar e não ficarem só na caixinha que foi montada pra eles nos últimos anos. Nós vamos ter que fazer mais. Não vamos ter mais uma pessoa pra analisar dados, uma pessoa pra olhar para GTM, uma pessoa para gerenciar projeto, uma pessoa pra escrever um copyzinho.”
”A gente vai ter que fazer o que a gente sempre deveria ter feito se não fosse por um mercado inundado de dinheiro.
”Se daqui pra frente, a nova realidade do mercado e de produto for essa, acho que vai ser um caminho melhor do que o que traçamos até aqui e, com isso, virá também um amadurecimento do papel do Product Manager. Ou seja, não adianta espernear, porque essa roda vai girar e o seu job description vai mudar. E assim como produtos, algumas pessoas vão se adaptar e ter sucesso. Outros vão ficar pelo caminho.”
Sejamos mais adaptativos e menos pilastras duras e intransponíveis.
E, então, o que você pensa sobre isso tudo? Será que é apenas clickbait ou, de fato, estamos vendo o cargo de product manager ser extinto? Acredito que o diálogo é uma das formas mais nobres de engrandecimento. Se você tem a algo para trazer a esta discussão, serei todos ouvidos, me chama lá no meu LinkedIn e vamos nessa!